quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Portugueses pioneiros em estudo da cafeína no Alzheimer


Nos últimos tempos, sucedem-se os estudos demonstrando o efeito protector da cafeína em relação ao desenvolvimento de Alzheimer, uma doença neurodegenerativa sem cura. Tudo começou em 2002, com a publicação de um artigo de dois investigadores portugueses. Esta é a história desse artigo pioneiro, no 'European Journal of Neurology'.
Um estudo publicado esta semana no Journal of Alzheimer Disease mostra que uma dose de cafeína equivalente a cinco chávenas diárias de café permite reduzir significativamente, no cérebro e no sangue de ratos idosos com Alzheimer, os níveis da proteína ligada à doença, diminuindo também os seus sintomas. Este é só o último de uma série de estudos nesta área, que se iniciaram no final da década de 90, pela mão de dois portugueses: Luís Maia e Alexandre Mendonça. Um pioneirismo que tem uma história e cujo futuro parece promissor.
Psicólogo de formação, Luís Maia decidiu fazer no final da década de 90 um mestrado diferente. Rumou à Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, e foi aceite no mestrado de neurociências. Sob a orientação de Alexandre Mendonça, neurologista e especialista em doenças neurodegenerativas no Hospital de Sta. Maria, em Lisboa, o hoje professor e investigador da Universidade da Beira Interior lançou-se numa investigação que acabou por um abrir um novo caminho. "Em 1999 saiu um artigo de cientistas norte-americanos, no qual se relatava um efeito neuro-protector da nicotina na doença de Parkinson", contou ao DN Luís Maia. Por essa altura, estavam também a ser desenvolvidos estudos para se perceber que factores poderiam ser neuroprotectores no envelhecimento. As xantinas, substâncias-primas da cafeína, tinham bons resultados em ensaios clínicos, em alguns países, e deste contexto surgiu a ideia de estudar a cafeína - um dos produtos "mais consumidos do mundo", sublinha Luís Maia -, em relação à doença de Alzheimer. "Lembrámo-nos de trabalhar com os doentes do Serviço de Neurologia do Hospital de Sta. Maria, olhando para a sua história de vida, e tentar perceber se a cafeína podia ser isolada como factor neuroprotector da doença", conta.
A pergunta era arriscada e o resultado poderia ter sido negativo. Mas o que aconteceu foi o contrário. "Utilizámos uma metodologia muito refinada, o estudo de caso - controlo emparelhado", explica o psicólogo. Durante um ano, foram avaliados 72 doentes de Alzheimer e comparados com 72 pessoas saudáveis com características de género, sociodemográficas, de idade e de escolaridade idênticas. "Para encontrarmos as pessoas tivemos de contactar mais de 150", lembra o investigador. Os resultados compensaram. Comparando a ingestão de café dos doentes nos 20 anos que antecederam o diagnóstico, com o mesmo período nas pessoas saudáveis, e também no pós-diagnóstico para os primeiros e no mesmo período para os saudáveis, verificou-se que os saudáveis haviam ingerido mais do dobro do café no primeiro período considerado, e quase o quádruplo no segundo.

Conclusão: quem não consome café tem um risco acrescido em 40% de desenvolver a doença de Alzheimer.

Estava aberto caminho a novos estudos. Alexandre Mendonça continua a desenvolver investigação na área. Luís Maia continua a trabalhar em doenças neurodegenerativas. Mas, cafeína, só nas duas a três chávenas que bebe todos os dias.

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